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sexta-feira, 11 de março de 2016

2 PESOS E 2 MEDIDAS: Como o ex-ministro Carlos Velloso reagiu à sua condução coercitiva.


Uma pequena fábula sobre a hipocrisia nacional.

Na segunda-feira passada, o Carlos Velloso, ex-Ministro aposentado do STF (Supremo Tribunal Federal) e do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) brilhou no programa Roda Viva, defendendo a condução coercitiva de Lula para depor.

Pela primeira vez na história, um ex-presidente foi depor em camburão da polícia. Nem JK que, convocado, compareceu em seu próprio carro. Nem isso sensibilizou Velloso. Segundo ele, Lula teria sido intimado, não compareceu, dando direito aos procuradores da República de exigir a condução coercitiva.

***

Exagero? Certamente não. A jurisprudência é formada pela sucessão de sentenças em cima de fatos concretos. E o maior libelo contra esses abusos partiu do próprio Carlos Velloso.

Em 2008, já aposentado do STF, Velloso foi intimado pela Polícia Federal a depor em inquérito da Operação Pasárgada, que investigava o desvio de recursos do FPM (Fundo de Participação dos Municípios). Ele tinha sido consultado por um dos acusados para pegar sua causa.

Ele estava sendo intimado pacificamente. Sua reação foi clara: não iria comparecer e só compareceria em local e data que ele definisse.

Velloso foi se queixar ao então presidente do STF, Ministro Gilmar Mendes (http://migre.me/tcaWj) do abuso da mera intimação.

Imediatamente Gilmar enviou ao presidente Lula a recomendação para edição de um projeto de lei punindo autoridades por vazamentos em operações sigilosas. Mendes declarou que estava disposto a combater vazamentos e prisões desnecessárias.

No dia 27 de junho de 2008, o site do STF publicou  mensagem de Velloso a Gilmar (http://migre.me/tcb4W).

“Não pude aceitar os termos da intimação que me enviou a Polícia Federal, deixada em meu apartamento e recebida ontem à noite, quando cheguei a Belo Horizonte para participar do casamento de um sobrinho. O mandado de intimação, datado de 25 do corrente, marcava meu depoimento para o dia 27, sexta-feira, às 9 horas da manhã, na sede da Superintendência em Minas Gerais, com a advertência de que o meu não comparecimento, sem motivo justificado, poderia ser passível de condução coercitiva, caracterizando ocorrência de delitos de resistência (art. 329), desobediência (art. 330) e desacato (art. 331), todos do Código Penal. Não é desse modo, evidentemente, que a Polícia deve se dirigir a um ex-presidente do Supremo Tribunal Federal e ex-presidente do Tribunal Superior Eleitoral”.

Se não é o modo de se dirigir a um ex-presidente do STF, porque seria no caso de um ex-presidente da República? Aliás, de forma muito mais grave porque a indignação de Velloso, no seu caso, foi despertada por uma mera intimação.

Dizia mais:

“A lei me concede a prerrogativa de marcar dia, hora e local para o depoimento, a atender a tal e ameaçadora convocação”.

Logo depois, Velloso recebeu comunicado do delegado indagando se pretendia receber um ofício marcando dia, hora e local por ele, Velloso, designados.

“Decidi que o meu depoimento seria dado ainda hoje, no horário de 16 horas, mas no escritório do Centro Jurídico Brasileiro, em Belo Horizonte, que frequento para receber pessoas e, muitas vezes, emitir pareceres”.

“Respondo à indagação de um repórter, se estaria existindo uma retaliação contra meus últimos pronunciamentos sobre prisões espetaculares de advogados – presos e algemados – e de outros cidadãos suspeitos, aprisionados por cinco dias para deporem, prorrogáveis por outros cinco dias, nas operações policiais que recebem nomes, aparatos e convocações de centenas de agentes. Tenho verberado contra as invasões de escritórios de advocacia, sugerindo inclusive à Ordem dos Advogados do Brasil que processe as autoridades que se conduzirem com abuso de poder. Não posso admitir que, por estar defendendo prerrogativas dos advogados, eu seja alvo de retaliações. Não as temo. Não as aceito”.

Se nem uma intimação formal Valloso aceitou, o que não ocorreria se ele tivesse sido conduzido coercitivamente, como Lula?

Hoje em dia, juiz de primeiro grau, promotor, obviamente desembargadores e ex-Ministros têm direito a definir hora e local para a tomada de depoimentos. Segundo Velloso, um ex-presidente da República, não.

É um desrespeito do próprio Velloso a um poder que, mais do que ninguém, caberia a ele honrar.

 

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