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sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Carga tributária no Brasil e no mundo: a verdade em números

- Do Cidade de Minas


Sobre a carga tributária brasileira. Mito despedaçado. Brasil NÃO tem a maior carga tributária do mundo - nem de perto.

Mitos econômicos brasileiros #1: “O Brasil tem a maior carga tributária do mundo”
Mitos são assim: alguém cria, outros repetem e os demais acreditam e passam adiante. E quanto mais a narrativa é ouvida sem reflexão, mais o mito se torna incontestável e se torna verdade. Também em economia os mitos existem. Mas raramente resistem à frieza dos fatos duros. Assim, o Novas Cartas Persas inaugura a seção “Mitos Econômicos Brasileiros”, que vai procurar justamente estimular a reflexão e o debate para desmistificar o senso comum construído e disseminado no noticiário.
Os primeiros três mitos da seção se referem à famigerada “carga tributária”, eternizada todo ano, em “recordes” registrados pelo diletante “impostômetro”, sempre uma boa pauta para os últimos meses do ano. Não raramente, as notícias do “impostômetro”, data de recolhimento de imposto de renda ou sobre carga tributária vêm também acompanhadas da opinião (sem fundamento) travestida de fato: “a carga tributária do Brasil, que é a mais alta do mundo…”; ou ainda “o brasileiro é quem mais paga imposto no mundo…”. E assim ficamos.
Não é beeeem assim. Estamos longe de ter a maior carga tributária do mundo. Vamos aos fatos. Quando comparamos com os países da OCDE, em geral capazes de prover serviços públicos de qualidade, constatamos que o Brasil não está nem no “top 10” da lista da OCDE:

Em comparação com os países ricos, não temos, nem de longe, a maior carga tributária do mundo: o país está no meio da tabela, é o 15º entre 35 países. Em listas com mais países, como o da Heritage Foundation, o Brasil cai para a 30ª posição.
O primeiro mito foi “desmistificado”.

Mitos econômicos brasileiros #2: “O Brasil tem uma carga tributária muito elevada”
Os “arautos da carga tributária” mais bem informados podem até reconhecer que é bobagem dizer que o brasileiro é quem mais paga impostos no mundo. Mas, ainda assim, poderão objetar que se trata de uma carga extremamente elevada, semelhante à do Reino Unido (35,2%) e bem maior que a de Canadá (30,7%) e Suíça (28,2%), que, diferentemente do Brasil, têm  excelente provisão de serviços públicos e seguridade social.
Certo. É verdade que muita gente paga muito imposto no Brasil, especialmente os assalariados (essa discussão merece ser feita, mas é outro debate). Mas fazer uma comparação usando apenas um único parâmetro, o de Carga Tributária Bruta (CTB) simplifica as coisas: dá a impressão de que Tributos = Dinheiro do Estado. Na realidade, as coisas não são bem assim. Um debate mal feito leva a políticas mal feitas. O “truque” está no uso disseminado e exclusivo do conceito de CTB, ou seja, total de impostos dividido pelo PIB.
Só que nem todo o dinheiro arrecadado pelo Estado fica com ele. Para fazer uma comparação justa dos países ricos com o Brasil (ou com qualquer país) é preciso ver efetivamente o quanto fica com o Estado.
Acontece que, do total “bruto” recolhido dos impostos pelo Estado, parte é redistribuída diretamente para o cidadão, na forma de transferências obrigatórias (aposentadorias, pensões, assistência e programas de renda mínima) e subsídios (financiamento habitacional, da produção industrial e agrícola, por exemplo), e não entra efetivamente na “caixa preta”.
Ao subtrair essas transferências e subsídios do total de tributos arrecadados pelo poder público temos a “carga tributária líquida” (CTL). O conceito é bastante útil para a análise. A CTL é a quantidade de recursos que efetivamente fica com União, estados e municípios para prover serviços públicos, investir em infraestrutura, defesa, manter a máquina, pagar juros etc.. Comparações com outros países usando esse conceito dão um ponto de partida melhor para debates sobre a eficiência do Estado.
Quando se trabalha com o conceito de CTL, o quadro brasileiro parece bem menos assustador: a carga tributária líquida do Brasil em 2012 vai de 35,85% para 19,82%. Mais: em comparação com o ano passado, a carga tributária líquida na verdade caiu (-1,74%) em relação ao ano anterior. Entre 2002 e 2012, a carga tributária líquida ficou praticamente estável, variando entre 17,28%, em 2003, e 20,17%, em 2011. Na média do período, a CTL ficou em 19,96% ao ano.
Na comparação com outros países, o Brasil “cai pelas tabelas”. No levantamento feito em 2008 (referente a 2007) pelo IPEA, entre 18 países, o país tinha a 10ª maior carga tributária bruta da lista, mas a 13ª carga tributária líquida.
Ainda assim, vendo o Brasil na 13ª posição não parece convincente (já que se esquece que é uma lista com 18 países). Mas quando outros países são incluídos na comparação, a carga tributária no Brasil já não parece ser tão alta. De acordo com dados de 2011 do Banco Mundial, ao se excluir da carga tributária transferências obrigatórias (como pensões e multas), o Brasil aparece na 59ª posição, entre 104 países, ficando muito próximo da média mundial e atrás de países como Chile, Uruguai e África do Sul, além, claro, de muitos países desenvolvidos (clique no gráfico abaixo para ampliar).
Ao contrário de muitos países emergentes, o Brasil tem um sistema universal de aposentadoria, o que é sistematicamente ignorado nos noticiários sobre impostos e “carga tributária”. E mais: diferentemente de muitos desses países e até mesmo dos EUA, o Brasil também possui um sistema público universal e gratuito de saúde, o SUS (embora, claro, não tenha a qualidade do sistema de países europeus) e, diferentemente de países como o Chile, o país oferece educação pública e gratuita, embora a qualidade em geral seja muito ruim. Mas isso explica em grande parte por que a carga continua sendo mais elevada que outros países emergentes que não possuem tal sistema de serviços públicos.

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