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quarta-feira, 5 de junho de 2013

As razões secretas para não aprovar a Reforma Política ( I )

Assistimos em 2013 a nova rodada de emperramento da tão necessária reforma política, que venha a aprimorar a democracia no Brasil. 

Interesses particularistas, principalmente dos maiores partidos, calcados em pretensões hegemônicas, vêm, ao longo dos anos, obstaculizando a aprovação de avanços na legislação partidária e eleitoral. 

Republico aqui artigo científico que escrevi quando cursei Especialização em Políticas Públicas, no Departamento de Ciências Sociais da UFG, em 2000. Creio que ajuda a compreender as razões políticas e os mecanismos que incidem sobre o tema. 

Passada mais de uma década, a crítica central que formulei continua plenamente atual, pois as alterações  casuísticas e tentativas de restrição à democracia continuam sendo a tônica da maioria das propostas que se pretenderam aprovar no Congresso Nacional nesse período. 

A famigerada cláusula de barreira, que em meu artigo mereceu cerrado combate, terminou amainada em 2006 por decisão do STF, quando, por unanimidade, os ministros presentes acompanharam o voto do relator, ministro Marco Aurélio Mello, declarando-a 
inconstitucional, considerando que a sua vigência provocaria o "massacre das minorias". Dessa forma, os ministros do STF acataram a ADIN (ação direta de inconstitucionalidade) promovida pelo PCdoB, com o apoio do PDT, PSB, PV, PSC, PSOL, PRB e PPS. Óbvio que não são esses partidos que detém maioria congressual e óbvio ao quadrado que foram as maiores legendas que impuseram a desigualdade na Lei dos Partidos (Lei 9.096/95). 

O inacreditável é que está de volta uma forte pressão da mídia mercantilista e de grandes partidos para aprovar uma nova cláusula de barreira no Congresso Nacional. 

A esperteza desses que estão se lixando para um avanço democrático real é tentar aprovar uma "reforma política fatiada", que, em essência, tem o objetivo de restringir direitos, para que os grandes partidos continuem grandes e os menores não tenham chance de crescer. 

Para fins didáticos, farei a republicação do artigo em quatro partes, com adaptações para o formato do blog. O conteúdo completo pode ser acessado no site jurídico JUS NAVIGANDI.
  
- Luiz Carlos Orro

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O difícil caminho da democracia

- crítica da legislação eleitoral e partidária do pós-85


Parte I



"... as dificuldades do mundo moderno não serão resolvidas pelo abandono da política, mas tão-somente pela transformação da política de forma tal que nos habilite a dar forma e a organizar a vida humana de maneira mais efetiva. Não temos a opção pela não-política" ( DAVID HELD )1


É pretensão deste artigo discutir as iniciativas de caráter legal-normativo atinentes à esfera eleitoral e partidária empreendidas no pós-85 pelas classes dominantes brasileiras. Nessa nova fase da história republicana, a construção do ordenamento jurídico partidário-eleitoral vem maculando a atual experiência democrática vivida pelo país, pois que as classes burguesas, sempre visando a manutenção do poder político, passaram a editar regras eleitorais e partidárias casuísticas e antidemocráticas.

 Tais regras, formatam e induzem, ab initio, as performances eleitorais, e têm privilegiado sobremaneira os chamados "grandes partidos", aqueles que constituem a expressão político-parlamentar do poder econômico, ao passo em que restringem a participação e crescimento de agremiações outras, como aquelas representativas de ideologias que defendem os interesses da classe operária, dos trabalhadores e setores populares da sociedade. Isso é o que se pretende demonstrar.

Por tratar da questão eleitoral no período histórico imediatamente anterior ao aqui abordado, a obra de Pereira2 serve de pano de fundo introdutório ao presente estudo. Revela, com clareza cristalina, que as elites econômicas não se pejam em promover a ruptura da própria ordem constitucional burguesa quando apenas as leis já não bastam à defesa de seus interesses de classe.

Os diligentes jornalistas trazem a lume dados que comprovam a assertiva que se faz acima: os votos dados aos conservadores a partir das eleições de 1945 (leia-se UDN+PSD+coligações à direita) vieram despencando: de 77% naquele ano, para 65% em 1950. Baixaram para 61% nas eleições de 1954. Em 1958 caíram para 59%, e, em 1962, somaram apenas 47% da preferência do eleitorado nacional.

A perda da maioria no campo institucional-eleitoral, além de fatores outros, como a assunção do trabalhista-reformista João Goulart à Presidência, com a renúncia de Jânio Quadros, e à questões da geopolítica estadunidense ditada pela guerra fria, levaram os "ardorosos" defensores da lei e da ordem à conspiração aberta. Em menos de dois anos, sobreveio o golpe militar, com apoio e ramificações civis e externas (EUA), que inauguraria o período ditatorial mais longo e sangrento da história brasileira.

Durante vinte e um anos, o regime militar, na marra e na lei, destruiu os partidos que surgiram no cenário político com o fim da ditadura Vargas em 1945. Reduziu o número de eleições e de cargos em disputa. Editou o Código Eleitoral (Lei 4.737/65, em grande parte vigente até hoje), a Lei Orgânica dos Partidos Políticos (Lei 4.740/65) que só veio a ser totalmente revogada em 1995), o Pacote de Abril, a Lei Falcão, dentre as mais conhecidas. 

Sob o lema "para cada eleição, uma nova lei que impeça o avanço oposicionista", no período ditatorial foram editados vinte e quatro leis e decretos-leis alterando o Código Eleitoral de 1965. Outros dezoito diplomas legais introduziram alterações na LOPP, a Lei Orgânica dos Partidos Políticos3. Surgiam sempre de encomenda, objetivando alterar os rumos da eleição seguinte; enfim, um festival de casuísmos legais que intentava impedir a vitória da oposição.

Partidos foram extintos, outros foram criados por decreto (ARENA e MDB); criou-se o exdrúxulo instituto da sublegenda para dar alguma elasticidade ao cenário de bipartidarismo imposto; a democracia e a soberania popular, em plenitude, foram suprimidas; instituíram-se "eleições indiretas" para Presidente da República, Governador, e, a partir de 78, para um terço dos Senadores, os famigerados biônicos. 

Na verdade, tratavam-se de verdadeiras indicações do Executivo para compor o Senado Federal, tudo sob estreito controle militar, como já vinha ocorrendo com os Prefeitos das Capitais, estâncias hidrominerais e áreas de segurança nacional, todos indicados, e não eleitos. No período, não faltou nem mesmo a solução "mágica" de prorrogar os mandatos de Prefeitos e Vereadores, cancelando-se, via de Emenda Constitucional, as eleições municipais de 1980.

Menos eleições, menos derrotas para a ARENA, e depois, para o PDS, era a lógica dos estrategistas do regime de exceção.

Perscrutando os dados das eleições do período de exceção, Pereira, Caropreso e Ruy vão concluir que nem assim eles, os conservadores, venceram, a considerar-se o MDB como pólo oposicionista e instrumento de luta pela democracia. 

Mesmo sob feroz repressão, com a cassação de mandatos eletivos, desmantelamento das entidades da sociedade civil, censura à imprensa, prisões à mancheia, tortura e assassinatos de lideranças oposicionistas, os votos dados à ARENA, de 1966 até 1978, e ao seu sucedâneo, o PDS, em 1982, continuaram em queda livre. 

Foram 50,5% nas eleições de 1966, o melhor resultado do período militar; 48,4% em 1970; 40,9% no pleito de 1974; 40% em 1978; e apenas 38,6% em 1982, quando reinstituídos o pluripartidarismo (com o fim precípuo de fragmentar a oposição ao regime) a a eleição para os governos estaduais. De 1966 até as eleições de 1978 (Deputados Federais, Estaduais e parte do Senado), o MDB Movimento Democrático Brasileiro- tornou-se o desaguadouro do sentimento democrático e oposicionista, cumprindo importante papel na crítica ao regime dos generais e na luta pela democracia. 

Já nas eleições de 1982, a frente oposicionista que era o MDB cindiu-se, surgindo o PDT – Partido Democrático Trabalhista- e o PT – Partido dos Trabalhadores. A ARENA travestiu-se de PDS – Partido Democrático Social. Passou a figurar ainda no cenário político o PTB – Partido Trabalhista Brasileiro-, que veio demonstrar-se useiro e vezeiro em acordos e negociatas de ocasião, sempre orbitando a esfera governista.

Após a derrota da Campanha das Diretas Já, que, em 1984, mobilizou milhões de brasileiros nos quatro cantos do país a clamar por eleições presidenciais diretas, o cenário da sucessão presidencial, em 1985, foi formado pela manutenção das regras eleitorais vigentes: deu-se através do Colégio Eleitoral. 

Nesse sentido, as eleições indiretas respondiam ao propósito da transição lenta e gradual calculada pelos ideólogos do regime militar4. Mas nem assim o regime conseguiu sobreviver, com Tancredo Neves, candidato oposicionista, sendo "eleito" Presidente no Colégio Eleitoral, terreno preparado para que os candidatos pró-regime nunca perdessem.



1985: INÍCIO DA RECONSTRUÇÃO DEMOCRÁTICA


Feita essa digressão, há que se adentrar no mérito pretendido: que tipo de democracia os novos representantes das classes dominantes alçados ao poder civil passaram a construir após o fim do ciclo militar, análise que se faz a partir do exame das leis eleitoral e partidária.

Para Meneguello, esse projeto foi materializado com o manifesto Compromisso com a Nação, de agosto de 1984, lançado pela coalizão formada entre a Frente Liberal (surgida com a cisão do PDS) e o PMDB, e refletia o teor moderado das mudanças políticas traduzidas na candidatura oficial de Tancredo Neves, presidente, pelo PMDB, e José Sarney, vice, pela Frente Liberal. Posteriormente, Sarney filiou-se ao PMDB. 

Em janeiro de 1985, a Frente Liberal tornou-se oficialmente o PFL. A plataforma mudancista tinha cunho eminentemente democrático, é inegável, compreendendo: institucionalização democrática, convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte, eleições diretas em todos os níveis e a reforma eleitoral e partidária.

Morto Tancredo e Sarney efetivado como Presidente, implementou este o ideário da Aliança Democrática, cujos principais compromissos foram cumpridos, sendo emblemática do período da Nova República a aprovação da Emenda Constitucional nº 25, de 15.05.1985, que introduziu: a) ampla reforma eleitoral e partidária; b) eleições diretas em dois turnos para presidente da República; c) eleições diretas em 1985 para prefeitos de capitais, áreas de segurança nacional e estâncias hidrominerais; d) liberdade de organização partidária, inclusive com a legalização do Partido Comunista do Brasil – PCdoB- e do Partido Comunista Brasileiro - PCB; e) direito de voto aos analfabetos.

Indispensável pontuar que a Emenda Constitucional nº 25/85 foi a picada precursora da nova estrada por onde se desenvolveria a democracia no Brasil. Assegurou a liberdade de criação de partidos políticos, inclusive possibilitando a reorganização daqueles que haviam tido seus registros "indeferidos, cancelados ou cassados."

Assim, puderam emergir da ilegalidade, após décadas de perseguição, os Partidos Comunistas, cuja existência legal sempre foi critério de aferição da ocorrência de maior ou menor grau de liberdades democráticas, não só no Brasil, mas em todo o mundo.6 Dessa forma, não seria nenhum exagero situar a Emenda Constitucional nº 25/85 como uma das mais importantes conquistas democráticas do Brasil desde 1945.

Porém, uma no cravo, outra na ferradura. Assim foi que os novos edificadores da democracia brasileira começaram a tarefa de soerguer o arcabouço da democracia, mal disfarçando ranços e institutos herdados do ancien régimeA legislação infraconstitucional passou a enquadrar e restringir os preceitos de ordem constitucional, sempre com a visível preocupação de limitar o número de partidos políticos e de garantir que aqueles que possuíam grandes bancadas parlamentares continuassem a eleger grandes bancadas.

Meneguello assevera, em seu estudo sobre aquele momento, que "os partidos brasileiros figuram como agentes centrais do processo democrático, são elementos necessários à organização e ao funcionamento dos governos e retiram da dinâmica governamental recursos para o seu desenvolvimento". 

É certo que Sarney, por não possuir base política própria, governou apoiando-se principalmente no PMDB e no PFL, além do PTB, durante a Nova República.Mas a autora passa ao largo da questão da construção dos pilares da democracia, os partidos políticos. Por isso, não enfoca que um dos traços marcantes do período que se seguiu imediatamente ao fim do regime militar – a formação de governo partidário - , deu-se concomitantemente com a construção do novo quadro partidário, sendo este moldado sob o prisma de uma democracia restrita, consentida pelos "grandes partidos".

 Os representantes políticos das classes burguesas sempre foram ciosos em manter sob controle os resultados eleitorais e o funcionamento dos partidos, e o que aqui se se quer demonstrar é que, no que se refere à legislação eleitoral e partidária, "a remoção do entulho autoritário"7 preconizada por Tancredo Neves fez-se com a edição de novo ciclo de leis casuístas, sempre objetivando moldar a democracia conforme os interesses da elite econômico-política. 

Lima Júnior assevera que "o processo político brasileiro caracterizou-se, nos últimos anos, do ponto de vista legal-institucional, por uma série de decisões de natureza ad hoc"8. Nesse sentido, há responsabilidade indubitável do PMDB e PFL, num primeiro momento, na aprovação da legislação casuísta, pois que os dois partidos detinham, à época de Sarney, elevada representatividade parlamentar: 55, 8% da Câmara dos Deputados9.

Ao depois, vieram o PPB e o PSDB integrar o rol das grandes bancadas no Congresso Nacional, geralmente cumprindo orientação governista, e que são justamente as bancadas que se esmeram em aprovar leis partidárias e eleitorais antidemocráticas, para preservar seus interesses particularistas.



A LEGISLAÇÃO PARTIDÁRIA


Foram necessários exatos dez anos para que se sepultasse a Lei Orgânica dos Partidos Políticos herdada do regime militar. Somente em 1995 veio a ser aprovada a novel legislação sobre os partidos, a Lei 9.096/95, já decorridos sete anos do advento da Constituição de 1988.

O lapso temporal, excessivamente longo, já é indicativo da estratégia de pé no freio com que os novos detentores do poder político trataram a questão partidária. E não se pode dizer que essa é questão de somenos importância. Pelo contrário, cuida-se de ponto crucial para o efetivo funcionamento de uma democracia.

Acerca de qual modelo de democracia se discute nessas linhas, as limitações do objeto proposto não permitem maior aprofundamento, pelo que se opta por apresentar brevíssimas considerações conceituais. Em da Silva10, a democracia é tratada como "conceito histórico". Não sendo por si um valor-fim, mas meio e instrumento de realização de valores essenciais de convivência humana"... Situa a experiência brasileira contemporânea com sendo uma democracia representativa, em que a "participação popular é indireta, periódica e formal, por via das instituições eleitorais que visam a disciplinar as técnicas de escolha dos representantes do povo".

Sobre a república democrática burguesa, Bottomore traz citação de Marx em As lutas de classes na França de 1848 a 1850, em que este analisa que, ao mesmo tempo em que sanciona o poder social da burguesia, esse sistema "retira as garantias políticas desse poder, impondo-lhe ‘condições democráticas que, a todo momento, contribuem para a vitória das classes que lhe são hostis e põem em risco as próprias bases da sociedade burguesa’" 11 

Lima Júnior12 propõe centrar o debate, no mínimo, em torno da formulação "democracia de massas, com alto grau de liberalização e participação". De qualquer forma, todavia, os institutos do sufrágio universal, liberdades políticas, império da lei e competição política hão que se fazer presentes.
A democracia brasileira que se constrói atualmente, como democracia representativa que é, deveria assegurar pleno respeito ao princípio constitucional da isonomia, visto que a igualdade constitui o signo fundamental da democracia13.

 Mas essa observância não vem ocorrendo quanto à matéria eleitoral e partidária. Senão, vejamos.

A Constituição de 1988 assegura no artigo 5º que " todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza...". Adiante, no capítulo V – DOS PARTIDOS POLÍTICOS -, garante o art. 17 da Carta Magna: " É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, resguardados a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais da pessoa humana e observados os seguintes preceitos: ... IV- funcionamento parlamentar de acordo com a lei. ... Já o parágrafo 3º preceitua que "Os partidos políticos têm direito a recursos do fundo partidário e acesso gratuito ao rádio e televisão, na forma da lei. " (sublinhamos, para destacar)

Ora, a igualdade de todos há que ser entendida em seu sentido material, e não apenas formal; ou seja, a igualdade perante a leie igualdade na lei, consoante as melhores doutrinas. Assim, o princípio constitucional tem como destinatário não só o aplicador da lei, o Poder Judiciário, mas também, e principalmente, o legislador, não assistindo a este editar leis desprovidas de necessário conteúdo generalizante quanto ao alcance da norma.

 Por isso mesmo é que, no Estado Democrático de Direito, o ordenamento jurídico não dá guarida às leis com endereço certo, onde ausente a generalidade normativa, recusando-as sob a pecha de inconstitucionalidade.

No entanto, ao regulamentar a Carta Política, a legislação infraconstitucional adotada após 1988 vem, em cascata, promovendo grave ruptura com o princípio da isonomia legal, ao estabelecer privilégios para os partidos que detém as maiores bancadas no parlamento federal, aqueles que reúnem maioria para aprovar a lei em benefício próprio, em detrimento dos demais partidos.

Tanto a Lei do Partidos Políticos – Lei 9.096/95-, como o diploma eleitoral vigente, a lei 9.504/97, que regeu as eleições de 1998 e as que estão em curso, foram editadas em desacordo com o princípio supracitado, ao estabelecerem profundas desigualdades nas condições de participação entre os chamados grandes e os pequenos partidos no processo eleitoral.Torquato Jardim, que serviu como Ministro no TSE, é incisivo em apontar vícios de inconstitucionalidade15 na legislação de regência.]

É curial observar que, frequentemente, vê-se nos meios de comunicação, sempre estimulado por representantes políticos dos partidos que hoje empalmam o poder, um enviesado debate sobre a necessidade de se promover a reforma política e partidária, onde sempre há aqueles que clamam por novas leis que venham restringir o número de partidos existentes.

Ora, a cláusula de barreira, principal ameaça à democracia representativa, à disputa em condições de igualdade entre as várias organizações partidárias, já existe; foi introduzida pela Lei dos Partidos Políticos, em 1995, impondo severas restrições às agremiações que não alcancem determinado patamar de desempenho eleitoral. Suas draconianas disposições, ainda que de certa forma amenizadas provisoriamente, estão em pleno vigor, como aqui se vai demonstrar.

A cláusula de barreira está contida no capítulo II – DO FUNCIONAMENTO PARLAMENTAR - , art. 13, da Lei dos Partidos – nº 9.096/95- fixando que somente tem direito a funcionamento parlamentar o partido que obtiver no mínimo 5% da votação para a Câmara dos Deputados. Exige ainda que este percentual esteja distribuído nacionalmente, com o mínimo de 2% por Estado em pelo menos 1/3 das unidades da Federação. Os percentuais são calculados desconsiderando-se os votos brancos e nulos.

Essa é a regra geral, de caráter permanente, que passou a ter vigência imediata, desde a publicação do texto legal. O texto é vago, e, em que pese a expressão "funcionamento parlamentar" não estar ainda de todo esclarecida, quanto ao seu significado e alcance, o certo é que a norma foi aplicada de pronto, provocando profundas distorções e agudas injustiças, principalmente quando se trata da distribuição dos recursos do Fundo Partidário e do horário gratuito no rádio e televisão entre os partidos.

À época da aprovação da LPP, a atuação dos partidos de esquerda, em especial das bancadas do PCdoB e PSB, resultou na fixação de uma regra provisória, inserta no art. 57, no Capítulo VI – DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS. Por essa regra, estabeleceu-se uma "clausulazinha de barreira", de 1% da votação nacional, mais a obrigatoriedade de eleger Deputado Federal em pelo menos 5 Estados. Criou-se, portanto, um período de transição, postergando-se para o ano de 2.006 a exigência da votação nacional mínima de 5%. 

Então, o que pretendem esses defensores de maiores restrições aos partidos é antecipar para já a vigência desse dispositivo, aliando a isso outros casuísmos como o voto distrital e o voto facultativo.

O que em geral é desconhecido da opinião pública é que esse período de carência em relação ao patamar de 5% dos votos não impediu a aplicação imediata dos critérios discriminatórios quanto à distribuição dos recursos do Fundo Partidário16 e do horário gratuito, reservando aos partidos que alcançaram a votação nacional de 5% parcelas escandalosamente maiores que aquelas destinadas aos partidos que atingiram a faixa de 1%. 

A distorção se agrava quando a comparação se faz em face dos partidos que nem mesmo chegaram ao 1%, como se esmiuça adiante.

 Em suma: a legislação partidária vigente instituiu, por assim dizer, partidos de 1ª, 2ª e 3ª classe.

(Continua...)


- Advogado, Consultor Jurídico Legislativo da Câmara Municipal de Goiânia.
Elaborado em 08/2000.


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